História de Caça
Já me confessei caçador. Para grande raiva de muito pseudo-ambientalista.
A história que deu origem a este artigo é rigorosamente verdadeira e optei por adulterar o nome do meu companheiro para que não seja insultado por leitor mais fundamentalista.
Pelo inusitado da situação acho que merece ser divulgada.
Javali à Sec XVII
Era um dia de meados de Outubro, luminoso, daqueles em que o Sol zigzagueia por entre nuvens grossas e pardas inchadas de água.
Um ventinho agradável estremece as copas das azinheirinhas do "projecto" e a ramagem dos vetustos eucaliptos que ladeiam o nosso caminho.
A despreocupação total pauta a nossa conduta no momento. Caçadeiras ao ombro em acento circunflexo e indecisão na acção futura. Passo de transumância. Quase torpor pastoril.
O meu companheiro, Eng. Anarca Torreira, mocetão de Trás-os-Montes com algum polimento resultante do convívio com gentes mais civilizadas do Sul, tasquinhava , no entanto, um malvado de um palito que lhe ficara de esgravatar furiosamente os despojos de lautíssimo almoço.
-" Pôúça, tôu que quaje num pócho mexer-me, carago!" Sopra através duma farta bigodaça brilhante de restinhos de gordura. " Ó Jé auguenta aí o gado, sacana!" grita para mim que o precedia não mais que 5 passos.
Levanto os olhos do chão para lhe retorquir uma qualquer aleivosia das minhas quando o meu eixo de visão passa por um vulto que, surgindo do nada, começa a correr por entre as piorneiras que seguem a ribeira próxima.
-" Um ganda cão? Esta é boa!".
A cerca de 40 metros o ser roda para a esquerda berrando eu para quem me queria ouvir: " Javali!, Javali!!!".
O que a seguir presenciei ainda agora me custa a creditar: Saltando lesto da pasmaceira em que vinha, o Eng. Anarca arranca-se em galope à carga, com uma frescura insuspeita, arma em riste já abastecida de uma bala, dá 20 passos, aponta e dispara quase em corrida, para cima do javardo.
" Axertei-lhe!" exulta , arfante de esforço e roxo entusiasmo.
" Uma porra é que acertaste. O bicho estava muito longe 70/80 metros pelo menos" resmunguei, invejoso.
" Axertei-lhe, caraxas. Caté ôubi a bala fajer pàhh...."
" Vou lá ver" disse eu muito pouco convencido, numa atitude estupidamente curiosa e desnecessária.
Enfio uma única bala na câmara de cima e um cartuxo de chumbo 7 na de baixo, e aí vou eu feito idiota ao encontro do azar.
"Auguenta qu’eu bôu buscar mais balas" exclama o Eng..
Não ligo ao «auguenta» e avanço chapada arriba em direcção ao ponto onde supunha que o animal se poderia encontrar. Aí chegado, sem nada topar, grita-me o Torreira "É mais prá esquerda!".
Viro-me, e a cerca de 10 passos está o malvado amagado, de costas para um carrasqueiro, a olhar cá para o Zé. Dá-lhe a veneta, e num impulso levanta-se e trota, cabeça alta, direitinho a este imbecil.
" Estou lixado. Vamos lá a ver o que dá esta m..." pensei.
Acerca de 3 metros dou-lhe o tiro que, alvar e inocentemente considerei, seria de misericórdia. Qual quê. O bichinho continua como se nada com ele fora.
A partir daqui a cena pode inscrever-se num qualquer guião revisteiro/humorístico de qualidade mais que duvidosa.
Imaginem este vosso amigo utilizando os canos da espingarda como se fosse uma espada terçando lâminas com a ponta da tromba do navalheiro, ao melhor estilo de D’Artagnan. Esqueci-me que tinha ainda um cartuxo disponível.
Não fora o javali já se encontrar bastante abalado, não sei o que teria acontecido, pois as «canonadas» que eu lhe dava não conseguiam sequer desviar-lhe as ventas nem meio centímetro. O verdadeiro «firme e hirto como uma barra de ferro».
Após cerca de 10 bravas estocadas dá-se a besta por vencida e pára. Consigo afastar-me. O Eng., que entretanto tinha chegado, remata a rês com, mais um, certeiro balázio.
Uma pequena locomotiva de 80 kg, macho jovem de 2 anos, com uma navalha partida rente (não, não, não fui eu, que diabo!). Ostentava um orifício no quadril traseiro esquerdo, do primeiro projéctil, e pasmem, um furinho no metatarso do quarto traseiro direito, resultado cá da pontaria do rapaz. Que grande artista eu sou! Aquela distância, de frente, fui fazer o mais difícil!
Em consequência tomei uma decisão!
Quando algum dia, nalguma espera ou montaria, virem um gajo com um encantador chapéu de plumas, uma capa de veludo (verde-seco, é claro) e uns canos de caçadeira entalados no cinturão não necessitam perguntar quem é. Adivinham já. Tiros... para quê?
Um ventinho agradável estremece as copas das azinheirinhas do "projecto" e a ramagem dos vetustos eucaliptos que ladeiam o nosso caminho.
A despreocupação total pauta a nossa conduta no momento. Caçadeiras ao ombro em acento circunflexo e indecisão na acção futura. Passo de transumância. Quase torpor pastoril.
O meu companheiro, Eng. Anarca Torreira, mocetão de Trás-os-Montes com algum polimento resultante do convívio com gentes mais civilizadas do Sul, tasquinhava , no entanto, um malvado de um palito que lhe ficara de esgravatar furiosamente os despojos de lautíssimo almoço.
-" Pôúça, tôu que quaje num pócho mexer-me, carago!" Sopra através duma farta bigodaça brilhante de restinhos de gordura. " Ó Jé auguenta aí o gado, sacana!" grita para mim que o precedia não mais que 5 passos.
Levanto os olhos do chão para lhe retorquir uma qualquer aleivosia das minhas quando o meu eixo de visão passa por um vulto que, surgindo do nada, começa a correr por entre as piorneiras que seguem a ribeira próxima.
-" Um ganda cão? Esta é boa!".
A cerca de 40 metros o ser roda para a esquerda berrando eu para quem me queria ouvir: " Javali!, Javali!!!".
O que a seguir presenciei ainda agora me custa a creditar: Saltando lesto da pasmaceira em que vinha, o Eng. Anarca arranca-se em galope à carga, com uma frescura insuspeita, arma em riste já abastecida de uma bala, dá 20 passos, aponta e dispara quase em corrida, para cima do javardo.
" Axertei-lhe!" exulta , arfante de esforço e roxo entusiasmo.
" Uma porra é que acertaste. O bicho estava muito longe 70/80 metros pelo menos" resmunguei, invejoso.
" Axertei-lhe, caraxas. Caté ôubi a bala fajer pàhh...."
" Vou lá ver" disse eu muito pouco convencido, numa atitude estupidamente curiosa e desnecessária.
Enfio uma única bala na câmara de cima e um cartuxo de chumbo 7 na de baixo, e aí vou eu feito idiota ao encontro do azar.
"Auguenta qu’eu bôu buscar mais balas" exclama o Eng..
Não ligo ao «auguenta» e avanço chapada arriba em direcção ao ponto onde supunha que o animal se poderia encontrar. Aí chegado, sem nada topar, grita-me o Torreira "É mais prá esquerda!".
Viro-me, e a cerca de 10 passos está o malvado amagado, de costas para um carrasqueiro, a olhar cá para o Zé. Dá-lhe a veneta, e num impulso levanta-se e trota, cabeça alta, direitinho a este imbecil.
" Estou lixado. Vamos lá a ver o que dá esta m..." pensei.
Acerca de 3 metros dou-lhe o tiro que, alvar e inocentemente considerei, seria de misericórdia. Qual quê. O bichinho continua como se nada com ele fora.
A partir daqui a cena pode inscrever-se num qualquer guião revisteiro/humorístico de qualidade mais que duvidosa.
Imaginem este vosso amigo utilizando os canos da espingarda como se fosse uma espada terçando lâminas com a ponta da tromba do navalheiro, ao melhor estilo de D’Artagnan. Esqueci-me que tinha ainda um cartuxo disponível.
Não fora o javali já se encontrar bastante abalado, não sei o que teria acontecido, pois as «canonadas» que eu lhe dava não conseguiam sequer desviar-lhe as ventas nem meio centímetro. O verdadeiro «firme e hirto como uma barra de ferro».
Após cerca de 10 bravas estocadas dá-se a besta por vencida e pára. Consigo afastar-me. O Eng., que entretanto tinha chegado, remata a rês com, mais um, certeiro balázio.
Uma pequena locomotiva de 80 kg, macho jovem de 2 anos, com uma navalha partida rente (não, não, não fui eu, que diabo!). Ostentava um orifício no quadril traseiro esquerdo, do primeiro projéctil, e pasmem, um furinho no metatarso do quarto traseiro direito, resultado cá da pontaria do rapaz. Que grande artista eu sou! Aquela distância, de frente, fui fazer o mais difícil!
Em consequência tomei uma decisão!
Quando algum dia, nalguma espera ou montaria, virem um gajo com um encantador chapéu de plumas, uma capa de veludo (verde-seco, é claro) e uns canos de caçadeira entalados no cinturão não necessitam perguntar quem é. Adivinham já. Tiros... para quê?
4 Comments:
Tudo jóia, Simy. Até teve graça.
***
Olá,
Vim aqui agradecer a tua visita ao meu mundo
:)
prazer e beijinhu
Caçador? Hmmm... er... hmmm... Pois é, o primeiro impulso é de esbravejar. Mas isto seria ter um pré-conceito tanto sobre o esporte como sobre tua pessoa. Então, vou me obrigar a engolir o talzinho (o preconceito) e procurar outras referências no teu blog pra entender mais sobre isso, tá? Quem sabe eu não passe até a gostar da coisa e saia atirando em certas castas mais baixas da nobreza portuguesa, hohoho... ;-)
Olá eu sou o Alentejano que postou no Páginas Tantas.
Vejo que és monárquico. Eu sou profundamente Republicano, podemos discutir isso.
Gostei da música.
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